quarta-feira, 18 de março de 2015

OUTROS CONTOS

«Reunião», por Arthur C. Clarke.
«Reunião»
Astro-Nave, por JPGalhardas

449- «REUNIÃO»

Povo da Terra, não tenham medo. Nós viemos numa missão de paz  – e por que não? Pois somos seus primos; já que estivemos aqui uma vez.

Vocês nos reconhecerão quando nos encontrarmos, dentro de poucas horas. Estamos nos aproximando do sistema solar quase tão rapidamente quanto esta mensagem pelo rádio. Já o Sol de vocês domina o céu à nossa frente. É o sol que nossos antepassados e os seus compartilharam há dez milhões de anos. Nós somos homens, como vocês; mas vocês esqueceram a sua história, enquanto nós nos lembramos da nossa.

Fomos nós que colonizamos a Terra, no reinado dos grandes répteis, que estavam perecendo quando viemos e que não pudemos salvar. Este mundo era então um planeta tropical, e pensamos que daria uma excelente morada para nossa gente. Estávamos enganados. Embora fôssemos senhores do espaço, muito pouco sabíamos sobre clima, evolução, genética...

Durante milhões de estios – pois não havia invernos naqueles velhos tempos – a colónia floresceu. Isolada como era obrigada a viver, num universo em que a viagem de uma estrela a outra dura anos, ela se manteve em contacto com a sua civilização-mãe. Três ou quatro vezes por século, era visitada por astro-naves que lhe traziam notícias da galáxia.

Mas, há dois milhões de anos, a Terra começou a mudar. Durante milhões de milénios tinha sido um paraíso tropical; depois a temperatura baixou e o gelo começou a descer lentamente dos pólos. À proporção que o clima se alterava, também mudavam os colonos.

Compreendemos que agora se tratava de uma adaptação natural ao fim do longo verão, mas aqueles que haviam feito da Terra o seu lar pelo espaço de tantas gerações acreditavam estar sendo vítimas de uma estranha e repulsiva doença. Uma doença que não matava, não causava nenhum dano físico – mas apenas desfigurava.

Entretanto, alguns ficaram imunes; foram poupados, eles e os seus filhos, pela mudança. De modo que, no espaço de poucos milénios a colónia se cindiu em dois grupos distintos – quase duas espécies distintas – que suspeitavam e tinham ciúme um do outro.

A divisão trouxe logo a inveja, a discórdia, e finalmente o conflito. À medida que a colónia se desintegrava e o clima ia constantemente piorando, aqueles que puderam fazê-lo retiraram-se da Terra. Os restantes mergulharam no barbarismo.

Podíamos ter-nos mantido em contacto, mas há tanto que fazer num universo de cem triliões de estrelas! Até poucos anos atrás não sabíamos se alguns de vocês haviam sobrevivido. Foi então que captamos os seus primeiros sinais de rádio, aprendemos as suas linguagens tão simples e descobrimos que vocês tinham realizado a longa ascensão a partir da selvageria.

Aqui viemos para saudá-los, nossos parentes há tanto tempo perdidos – e para ajudá-los.
Muitas coisas descobrimos durante os milénios decorridos desde que abandonamos a Terra. Se desejam que façamos voltar o eterno verão que aqui reinava antes das épocas glaciais, nós podemos fazê-lo. Acima de tudo, temos um remédio simples para a desagradável, embora inofensiva, epidemia que atacou tantos colonos.

Talvez o seu ciclo tenha terminado – mas, em caso contrário, temos boas notícias para lhes dar. Povo da Terra, vocês podem reunir-se mais uma vez à sociedade universal sem sentirem vergonha nem constrangimento.

Se alguns de vocês ainda continuam brancos, nós podemos curá-los.

Arthur C. Clarke

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