sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

TRÊS SONETOS DU BOCAGE

O poeta Manuel Maria Barbosa du Bocage, ou simplesmente Bocage, ou ainda usando o pseudónimo de Elmano Sadino, faleceu vítima de um aneurisma quando contava apenas 40 anos. Foi no dia 21 de Dezembro de 1805, em Lisboa, que desapareceu um dos grandes poetas do movimento literário neoclássico português. Pode consultar aqui- «ANIVERSÁRIO «DU BOCAGE», publicação que também lhe dará acesso a outras hiperligações, onde poderá ficar a saber um pouco mais sobre vida e obra deste grande poeta, nascido na cidade de Setúbal. Boas leituras! 
Poet'anarquista
«Poeta Bocage»
Desenho por Francisco Pastor

INVOCAÇÃO À NOITE

«Ó deusa, que proteges dos amantes
O destro furto, o crime deleitoso,
Abafa com teu manto pavoroso
Os importantes astros vigilantes.

Quero adoçar meus lábios anelantes
No seio de Ritália melindroso;
Estorva que os maus olhos do invejoso
Turbem d'amor os sôfregos instantes:

Tétis formosa, tal encanto inspire
Ao namorado Sol teu níveo rosto.
Que nunca de teus braços se retire!

Tarda ao menos o carro à Noite oposto,
Até que eu desfaleça, até que expire
Nas ternas ânsias, no inefável gosto.»

Bocage

CAMÕES, GRANDE CAMÕES

Camões, grande Camões, quão semelhante
Acho teu fado ao meu quando os cotejo!
Igual causa nos fez perdendo o Tejo
Arrostar co sacrílego gigante:

Como tu, junto ao Ganges sussurrante
Da penúria cruel no horror me vejo;
Como tu, gostos vãos, que em vão desejo,
Também carpindo estou, saudoso amante:

Lubíbrio, como tu, da sorte dura,
Meu fim demando ao Céu, pela certeza
De que só terei paz na sepultura:

Modelo meu tu és... Mas, ó tristeza!...
Se te imito nos transes da ventura,
Não te imito nos dons da natureza.

Bocage

SONHO

De suspirar em vão já fatigado,
Dando trégua a meus males eu dormia;
Eis que junto de mim sonhei que via
Da Morte o gesto lívido e mirrado:

Curva fouce no punho descarnado
Sustentava a cruel, e me dizia:
«Eu venho terminar tua agonia;
Morre, não penes mais, ó desgraçado!»

Quis ferir-me, e de Amor foi atalhada,
Que armado de cruentos passadores
Aparece, e lhe diz com voz irada:

«Emprega noutro objecto teus rigores;
Que esta vida infeliz está guardada
Para vítima só de meus furores.»

Bocage

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